Publicado por Autism Asperger's Digest Magazine
Como descobrimos no artigo do último mês, a comunicação é um processo dinâmico que muda a cada momento. Tornar-se num parceiro social bem sucedido estende-se muito para além de aprender as palavras ou acções socialmente adequadas, significa ter um bom pensamento social que permita reconhecer de onde vêm estas vêm.
Como descobrimos no artigo do último mês, a comunicação é um processo dinâmico que muda a cada momento. Tornar-se num parceiro social bem sucedido estende-se muito para além de aprender as palavras ou acções socialmente adequadas, significa ter um bom pensamento social que permita reconhecer de onde vêm estas vêm.
Os Quatro Passos da Comunicação, apresentados no último artigo, esboçam a natureza intrincada e inter-relacionada da comunicação, a dança fluida da interacção verbal e não-verbal, que aparece todas as vezes que duas ou mais pessoas se juntam. Neste artigo, e nos que se seguem, iremos discutir os quatro passos em detalhe e fornecer algumas estratégias básicas para ajudar os alunos com dificuldades no pensamento social a serem melhores parceiros sociais.
Agora pare um momento e tente lembrar-se de um encontro social que tenha tido recentemente com alguém. Enquanto o faz, verifique os pensamentos sociais que se seguem e considere o facto de que alguns deles, ou mesmo todos, estiveram consciente ou inconscientemente presentes durante esse encontro, muitas vezes por apenas milésimos de segundos:
O que é que sei sobre esta pessoa? Que “história” temos juntos?
Gosto desta pessoa e quero falar com ela, ou quero evitá-la? Em qualquer dos casos desenvolveu, mentalmente, um plano para se envolver na interacção ou para se afastar de uma forma educada.
Recorde as intenções desta pessoa em comunicações anteriores: existiram objectivos finais (positivos ou negativos) ou foram contactos puramente sociais?
Se foram sociais, do que é que esta pessoa gostou de falar? Quais os assuntos que podem ser problemáticos?
A um nível inconsciente, utilizamos outras competências sociais para manter o nosso papel numa interacção comunicativa. Mostramos interesse pelos outros mesmo quando o tema de que estão a falar não nos entusiasma, monitorizamos os nossos patrões emocionais e intencionais e fazemos pequenos ajustes para nos mantermos em interacção de uma forma positiva; procuramos respostas emocionais nas pessoas; fazemos por não monopolizar a conversa e, quando as coisas não correm bem, usamos mecanismos de conversação para reparar o rumo do diálogo.
E se a pessoa não lhe for familiar – por exemplo, um estranho que conheça numa conferência ou enquanto compra um novo par de sapatos? Nesse momento aparecem outras competências sociais: toma atenção aos atributos físicos para determinar o género, idade, preferências; usa as suas próprias capacidades ligadas ao pensamento social para fazer “suposições inteligentes” acerca de como interagir; monitoriza cuidadosamente o desenrolar da interacção e se esta está a seguir um caminho positivo ou negativo; repara nas respostas emocionais da outra pessoa, nas escolhas dos assuntos, etc, julgando o que deve dizer ou fazer; monitoriza as suas próprias reacções para determinar em que medida se sente seguro e interessado, ou não, em continuar a interacção ou, pelo contrário, em interrompê-la.
Embora possa parecer surpreendentemente óbvio que não consigamos comunicar eficazmente sem nos envolvermos num processo de reflexão contínuo, quando os alunos com dificuldades no pensamento social são colocados em grupos tradicionais de “desenvolvimento das competências sociais”, é frequente gastarmos a maior parte do tempo a praticar o diálogo entre eles (através de estratégias como manutenção de tópicos, turn taking, etc.). O que precisamos de fazer é gastar mais tempo a ensinar-lhes o processo extremamente activo, mas discreto, do pensamento social que enriquece a conversação. Ensinar os alunos acerca do pensamento social chama-se ensinar a “tomada de perspectiva” (também referida como Teoria da Mente). Queremos que aprendam a pensar acerca do pensamento, que é, logicamente, o 1º Passo dos Quatro Passos da Comunicação: pensar acerca dos pensamentos e sentimentos das outras pessoas assim como dos nossos próprios.
Antes de conseguirmos delinear estratégias ou tentar ensinar os nossos alunos a pensar sobre o pensamento, é preciso que tenhamos um conhecimento claro a esse respeito. O que é que quer dizer “pensar acerca do pensamento”?
A tomada de perspectiva (TP) das crianças que se encontram dentro do espectro do autismo pode variar enormemente. Alguns alunos têm um nível de TP muito baixo, não apresentando sequer consciência de que as outras pessoas têm sentimentos e pensamentos diferentes dos seus. Podem pensar, literalmente, que toda a gente pensa as mesmas coisas e ao mesmo tempo do que eles! Talvez já tenha conhecido uma criança com autismo que começasse as frases como se já estivesse a meio de um assunto e que ficasse surpresa por você não saber do que é que ela estava a falar. Estas crianças pensam que você já “ouviu” a parte anterior e que podem simplesmente seguir em frente com o assunto. Neste nível de desenvolvimento da TP, as lições podem incluir:
Compreender que as pessoas têm pensamentos únicos baseados nas suas próprias experiências individuais.
Por vezes as pessoas manipulam o nosso pensamento, tentando fazer-nos pensar algo que não é verdade.
Os pensamentos das pessoas afectam as suas emoções; as suas emoções afectam os seus pensamentos.
As pessoas podem ter um determinado efeito na forma como os outros pensam e sentem.
É esperado que os seus parceiros sociais pensem uns nos outros.
Se não agirmos de acordo com as expectativas dos outros, eles têm pensamentos “estranhos” a nosso respeito e vice-versa.
Quando existem várias pessoas num grupo, temos que pensar em cada uma delas e nos diferentes pensamentos que estão a ter, e não apenas numa delas ou em poucas.
Indivíduos num nível mais alto do espectro do autismo podem ter a capacidade de TP mais intacta. O nosso trabalho é ajudá-los a aprender acerca das nuances e sofisticação existentes no pensamento social. Algumas das lições associadas com este tipo de pensamento podem incluir:
Os pensamentos e as expectativas sociais mudam com a idade. A forma como as pessoas pensam a meu respeito aos 6 anos de idade é muito diferente da forma como o fazem quando tiver 12 ou 18.
Lembrar-me da história social entre mim e os outros demonstra que estou interessado neles.
Todas as minhas acções podem alterar a forma como os outros pensam ou se sentem a meu respeito: é importante monitorizar, a todo o momento, o que digo ou faço quando estou ao pé de outra pessoa.
Todas as pessoas tentam ler as intenções dos outros. Fazem isto, observando o que você digo e o que faço ou o que NÃO digo e NÃO faço.
Perceber que tenho pensamentos acerca de outras pessoas não é o suficiente; também tenho que tentar adivinhar como é que eles se estão a sentir/pensar a meu respeito.
Tenho que gastar tempo a falar com as outras pessoas sobre assuntos que sejam interessantes para elas, mesmo que seja aborrecido para mim. Aprendemos em crianças a “mentir socialmente”.
As minhas acções têm importância, e tenho que aceitar a responsabilidade pela parte que me compete no jogo da interacção social. Dizer que “não me importo” acerca dos sentimentos das outras pessoas acaba por ofendê-las e fazer com que me tratem pior.
Embora os conceitos de que falámos possam ser lógicos, ensiná-los é um processo profundo e intensivo em termos de tempo, muitas vezes estende-se ao longo de anos. Muitos dos nossos alunos com Síndrome de Asperger ficam “presos” nos seus próprios pensamentos acerca do mundo e de como as outras pessoas os fazem sentir. Apesar de poderem ser lições muito complexas, é necessário discutir o processo de pensamento de forma a ajudar os nossos alunos a focarem a sua atenção no que as outras pessoas estão a pensar e no impacto que os seus comportamentos têm nelas.
No próximo artigo iremos pegar nestas ideias e traduzi-las em algumas estratégias práticas que podem ser usadas na escola e em contexto familiar/comunitário.